Retornamos após um pequeno hiato… Como vimos, dada uma matriz (que até agora só consideramos real) , quadrada , seu polinômio característico
é o ponto de partida da análise de seus autovalores e autovetores. Já sabemos que se trata de um polinômio de grau em , e que suas raizes
corresponderão aos autovalores de . Notem que alguns dos coeficientes podem ser facilmente já determinados. Por exemplo (confiram!):
(inspeção direta do determinante)
(regra de Laplace)
(vem diretamente de )
O teorema de Cayley-Hamilton é equivalente a afirmar que a matriz é uma raiz do seu polinômio (matricial agora) característico, i.e.,
Este teorema tem uma longa e curiosa história, o verbete da wikipedia tem boas referências. Antes de passarmos às possíveis provas deste teorema, vamos repassar algumas de suas conseqüência. A primeira, e mais óbvia, é que a -ésima potência de uma matrix quadrada pode ser escrita como uma combinação linear de suas potências menores que . Isto permite muitas simplificações. Por exemplo, o quadrado de qualquer matrix é uma combinação linear da própria matriz e da identidade. Mais interessante ainda, qualquer potencia de uma matriz será uma combinação linear entre e . Vejam um exemplo explícito. Seja a matriz
seu polinômio característico é e portanto o teorema de Cayley-Hamilton garante que satisfaz a equação
Suponha que você queira calcular . Teremos:
,
e assim poderíamos fazer para qualquer potência de . O cálculo dos coeficientes na “expansão” de pode ser consideravelmente simplificado caso seja diagonalizável, vejam o livro do Hoffman&Kunze.
Outra conseqüência interessante está relacionado com a inversa de . O teorema de Cayley-Hamilton implica que, para qualquer matriz quadrada , temos
de onde temos que, se , a matriz entre parêntesis será . Trata-se, portanto, de uma fórmula que nos permite expressar a inversa de qualquer matriz em função de suas potências menores que .
O teorema de Cayley-Hamilton não é tão estranho quanto parece. A existência de uma relação entre as potências de uma matriz quadrada pode ser notada já com argumentos muitos simples. Primeiro, considere um vetor não nulo arbitrário, e defina a seqüência . No máximo, teremos vetores L.I. nessa seqüência, o que implica que deve haver uma relação do tipo
para um dado vetor . O teorema de Cayley-Hamilton nos mostra que existe tal relação, que será válida para todo vetor .
Uma outra mostra da plausibilidade do teorema de Cayley-Hamilton eu deixo como exercício: prová-lo para o caso de matrizes diagonalizáveis.
As provas
Há inúmeras provas do teorema de Cayley-Hamilton por ai, dos mais variados graus de dificuldade. Há provas “combinatórias“, analíticas (polinômios matriciais são contínuos e as matrizes diagonalizáveis em são densas) e a minha preferida: a prova usando cálculo no plano complexo (ver também o material aqui.) Todas estas provas envolvem conceitos um pouco mais avançados, talvez fosse mais interessante revisitá-las daqui a alguns anos… 🙂
Apresentarei aqui a prova que me parece mais simples no sentido de que é a que utiliza provavelmente conceitos mais elementares, disponíveis a todos agora. Antes, porém, é obrigatório falar da “prova” errada (“bogus proof“) extremamente popular na internet. A idéia seria fazer a substituição na definição do polinômio característico, e teríamos
Bem, isso é errado in so many levels que nem sei por onde começar. Notem, primeiro, que deveria seu uma matriz, mas o lado direto da equação acima é um número. Quer dizer, essa identidade não faz sequer sentido. O verbete da wikipedia tem alguma discussão sobre isso.
A prova mais simples utiliza a noção elementar de matriz adjunta, i.e., a matriz transposta dos cofatores de uma dada matriz. O importante é que para qualquer matriz quadrada , temos a identidade
,
de onde segue naturalmente a fórmula para a inversa conhecida da quinta série.
Seja a adjunta da matriz , i.e.
Antes de continuarmos, notem que é, efetivamente, uma “função matricial” de , i.e., dado um número real , nos retorna uma matriz , i.e.,
da definição de adjunta, temos que envolverá no máximo potências de , e portanto podemos escrever
sendo matrizes que não dependem de . Substituindo-se na expressão (1) acima e colecionado-se os termos de mesma potência em , tem-se
igualando-se os termos de mesma potência de em ambos os lados da igualdade, teremos
Agora, multiplicando-se a primeira linha por , a segunda por , etc, e somando-se todas as equações, teremos do lado direito e do lado esquerdo uma soma telescópica cujo o resultado é zero, estabelecendo o teorema da maneira mais simples que conheço.
[…] primeira invoca o conhecido teorema de Caley-Hamilton, cuja discussão pode ser encontrada nesta entrada de um curso não muito antigo, de uma época mais recente, já não tão repleta de ingênua […]
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